Artur Semedo - artur.semedo@publiracing.pt
1 de out.


Artur Semedo - artur.semedo@publiracing.pt
15 de set.







Há muito que observo pelas estradas com uma sensação clara: Portugal tornou-se um caso sério na eletrificação. De repente, ver carros 100% elétricos deixou de ser exceção para ser rotina. Mas agora, com a proposta da ERSE (Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos) para 2026, senti que podemos ter ainda mais condições para uma transformação mais acelerada — a ideia é de que podemos estar à beira de uma segunda vaga de crescimento, desta vez empurrada pelo preço do carregamento.
A ERSE propõe para 2026 uma descida de 31,9% nas tarifas da Entidade Gestora da Mobilidade Elétrica (EGME) aplicáveis aos comercializadores (CEME) e operadores de pontos de carregamento (OPC), e de 31,5% para os detentores de pontos de carregamento (DPC), face a 2025. Na prática, estamos a falar da “peça regulada” que entra na fatura sempre que carregamos num posto público. Não é todo o preço, mas é uma fatia importante.
Se — e este “se” é fundamental — essa descida for integralmente repercutida no preço final ao utilizador, carregar um elétrico na via pública pode finalmente deixar de ter aquela sensação paradoxal de “energia limpa, preço sujo”.
Antes desta proposta, Portugal já jogava numa liga acima da média europeia. Em 2024, os veículos elétricos (100% elétricos + híbridos plug-in) chegaram a representar cerca de 33% dos novos registos, bem acima dos 11,4% de Espanha, e num contexto em que a média da UE para elétricos a bateria andava pelos 15,8% e Portugal terminava o ano com valores superiores a 20%.
Nos último meses, os 100% elétricos (BEV) já representaram praticamente 30% das vendas de ligeiros de passageiros novos em Portugal.
O destaque para os dados da ACAP para o mês de outubro mostram aumento expressivo dos veículos elétricos (BEV), que atingiram 28,6% das novas matrículas, um valor recorde para o mercado nacional. No acumulado do ano, os elétricos representam 22% das vendas de ligeiros de passageiros, reforçando a transição em curso para uma mobilidade mais sustentável.

No conjunto das energias alternativas — que incluem elétricos, híbridos plug-in (PHEV) e híbridos convencionais (HEV) —, estas já somam 68,4% das novas matrículas de automóveis ligeiros de passageiros. O gasóleo continua em forte declínio, representando apenas 5,7% do mercado, enquanto a gasolina mantém 25,8% de quota.
Ou seja: Portugal já é um dos países europeus onde, em termos percentuais, mais se vendem carros elétricos. E isto num país com rendimentos médios mais baixos que grande parte do “núcleo duro” da UE.
Se o custo do carregamento descer de forma visível em 2026, é difícil não imaginar um salto adicional na procura, especialmente entre quem anda ainda preso ao medo da fatura.
Aqui entra a parte em que entra minha desconfiança saudável.
A ERSE faz a sua parte na parcela regulada, mas o preço que vemos no ecrã do posto junta vários ingredientes:
tarifa EGME (regulada),
energia em si,
margens do CEME,
custos e margens do OPC,
impostos.
Se a descida de mais de 30% na componente EGME for usada apenas para engordar margens em vez de reduzir o PVP, a proposta corre o risco de se transformar em oportunidade perdida (para o consumidor). O utilizador final não quer saber de acrónimos — CEME, OPC, EGME, DPC. Quer saber quanto paga por kWh, quanto paga por 100 km e se isso é, ou não, mais barato do que ir à bomba de combustível.
É aqui que, na minha opinião, o regulador e o Governo deviam ir mais longe:
acompanhar publicamente a evolução dos preços médios de carregamento,
publicar comparações antes/depois da medida,
e, se necessário, apertar a malha da transparência para garantir que a redução tarifária não morre na cadeia de valor antes de chegar ao cabo de carregamento.

Muita gente olha para estas notícias e pensa: “isso é para quem já tem elétrico, não é para mim”. Discordo.
Se o custo de utilização dos elétricos descer de forma real, o mercado vai reagir:
Mais pessoas vão considerar um BEV na próxima compra,
o valor de retoma de usados a combustão pode sentir pressão mais cedo, o que lentamente se vem sentindo cada vez mais.
e as próprias marcas vão acelerar a oferta de versões elétricas em segmentos onde hoje ainda hesitam.
Num país onde os preços de combustíveis continuam elevados e o custo total de uso do automóvel pesa cada vez mais no orçamento familiar, qualquer movimento que torne o elétrico estruturalmente mais competitivo é também um recado para quem insiste em adiar a transição.
Não estou a dizer que todos podem — ou devem — trocar amanhã. Há contextos em que a rede de carregamento ainda não responde, há perfis de uso que continuam mais ajustados a híbridos ou mesmo a combustão. Mas a direção de viagem é clara: cada vez que a barreira económica baixa, a desculpa técnica perde força.
Se pudesse deixar uma “lista de desejos” para 2026, seria algo assim:
Compromisso público dos principais CEME de repercutir a descida tarifária em percentagem semelhante na fatura final de carregamento normal e rápido.
Ferramentas simples de comparação de preços entre operadores, como hoje já acontece com combustíveis — ninguém devia ter de navegar menus obscuros para saber quanto vai pagar por kWh.
Maior foco nos carregamentos fora dos grandes centros, onde muitos condutores continuam a sentir que “o elétrico é coisa de Lisboa/Porto”.
Articulação com políticas de estacionamento e circulação urbana, para que o elétrico não seja só mais um carro, mas parte de uma mobilidade mais inteligente.
Porque baixar tarifas é uma excelente notícia, mas não chega. É preciso transformar essa redução em confiança — confiança de que o elétrico não é apenas ecológico, mas também racional e previsível na carteira.

Como observador diário da mobilidade em Portugal, vejo esta proposta da ERSE como um passo muito importante. Num país que já está na linha da frente da eletrificação, baratear o custo de carregamento pode ser o gatilho que faltava para transformar “tendência” em “novo normal”.
Mas, como sempre, o resultado está nos detalhes:
se a descida ficar na regulação e não chegar ao posto, será mais um capítulo de frustração; se for sentida no bolso, teremos um 2026 em que muitos condutores vão olhar para o elétrico e pensar, talvez pela primeira vez:
Eu, particularmente, como utilizador de carregadores públicos de forma rotineira, tive o cuidado de diversificar os cartões ou aplicações de carregamento para permanentemente comparar e avaliar condições reais de mercado e, não só escolher a melhor opção em termos de preço, como também daí tirar experiencias reais de atendimento e funcionamento, para poder "sentir na pele" quais os resultados em termos práticos do dia a dia elétrico em testes e ensaios. Em 2025, mais de 70% dos veículos que passaram pela nossa redação foram 100% elétricos e a disputa pela melhor opção de cartão/aplicação é cada vez mais disputada.
E é aqui que quero ver o debate aceso: não em slogans, mas em contas feitas e experiências reais de quem carrega regularmente.
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